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Doença e saúde

É fundamental deixarmos de nos identificar tanto com a doença. Porém, é normal sentirmos medo da doença e também termos a necessidade de nos sentirmos bem. A doença é um sintoma do corpo sofrendo a ação do tempo e aos poucos nos aproximando da morte. Cada vez que a gente vivencia a doença, entramos em contato com as sensações desagradáveis e logo em seguida com o medo de morrer. Esses são dois fatores muito presentes na nossa relação com a doença e é em detrimento de querermos evitar as sensações desagradáveis e querermos evitar a morte que fazemos de tudo para controlar a nossa relação com a doença.
É importante sabermos a diferença entre saúde e doença. A saúde consiste em levarmos uma vida querendo estar sempre bem e trabalhando para manutenção do corpo. Atualmente a nossa sociedade não tem uma ênfase na saúde e sim no tratamento de doenças. Quando falamos, por exemplo, sobre as medidas que são tomadas hoje em dia pela OMS ou pelo Ministério da Saúde, percebemos que muitas medidas são indicadas com o intuito de combater a doença, mas pouco se fala em prevenção ou em redução de danos antes que a doença chegue. Recentemente tem se desenvolvido essa consciência da saúde da família, da importância da prevenção, mas ainda assim a nossa sociedade ocidental não costuma se basear muito na prevenção e na saúde, e sim na doença.

O esforço para difundir a prevenção é muito pouco comparado ao esforço para tratar a doença, principalmente pela influência da indústria farmacêutica.

A maioria das pessoas se perde pois se preocupa com a doença e negligência a sua própria saúde. A doença acaba chegando inevitavelmente, sendo que se estivéssemos nos prevenindo e cultivando uma mente estável e um corpo saudável, dificilmente as doenças iriam nos abater.

À medida que estamos sempre movidos pela adrenalina, produzindo cortisol, o nosso corpo está sempre em estado de alerta e a imunidade estará sempre baixa. Gastamos muita energia como se estivéssemos nos protegendo de um predador. É muito importante percebermos que a nossa saúde física está muito relacionada a saúde mental. Não é só sobre nos importarmos com a saúde física, porque se negligenciarmos a saúde mental o nosso corpo irá padecer. O incentivo é que busquemos cultivar atenção à nossa saúde e não uma preocupação em relação as doenças. Isso não significa que não devemos nos prevenir, até porque a meditação não serve como substituto de nenhum outro tipo de tratamento convencional, ela é apenas uma ferramenta que nos ajuda a reduzir os efeitos colaterais, aprendendo a lidar melhor com a doença. Precisamos entender que não é necessário esperar a doença chegar para começarmos a nos cuidar.

Por que alguns indivíduos vivem saudáveis por muito tempo? As pessoas que tem longevidade, normalmente possuem uma mente tranquila. Não é à toa que as pessoas no oriente vivem tanto tempo. A qualidade de nossa mente vai determinar a duração da nossa vida. Se tenho a mente muito agitada, é como se estivesse gastando a gasolina que tenho no tanque muito rápido! Se tenho a mente tranquila é como se eu soubesse dosar o uso desse combustível. Precisamos desacelerar a mente como uma forma de vivermos mais. Pessoas mais tranquilas vivem mais. O coração bate mais devagar, a respiração é mais lenta e consequentemente as células envelhecem mais devagar. É por isso que meditadores tendem a ter uma aparência saudável. A meditação libera os hormônios da felicidade e do prazer (dopamina, ocitocina e endorfina) e proporciona-nos mais saúde.

A diferença entre um corpo movido por adrenalina e cortisol e um corpo movido pelos hormônios da felicidade é gritante. O maior medo que surge com a doença, antes de sentirmos o medo da morte, é o medo das sensações desagradáveis (dor, tensão, contração, formigamento). Quando começo a sentir que a doença está chegando, já antecipo todas as sensações desagradáveis que irei sentir perante aquela doença e esse é o nosso maior medo. Depois disso vem o medo da morte, ou a aflição perante o que pode acontecer se não nos curarmos logo. Esses são os dois principais pontos que estão presentes quando a doença chega.
É importante notarmos que já existem muitos estudos que falam sobre a importância da meditação para lidarmos com a dor física. Há uma grande diferença entre uma mente que medita e enfrenta uma fibromialgia, por exemplo, e uma mente que não medita. O nível de resiliência do meditador faz com que ele consiga lidar melhor com a dor. Enquanto meditadores, devemos exercer essa postura perante as doenças, sabendo que se tivermos uma mente e uma concentração firme, saberemos acolher as sensações desagradáveis da doença sabendo que elas irão passar e isso irá facilitar o tratamento.

Quando adoecemos ou alguém próximo de nós adoece, logo vem esse medo do desagradável e o medo da morte. É como se aquela dor ou a doença daquela pessoa fosse durar para sempre e não é bem assim. As doenças e sensações desagradáveis também passam, apesar de algumas durarem mais tempo. Algumas precisam de intervenções médicas, outras não, mas as doenças também passam. Não reconhecemos isso porque nos apegamos à doença e é como se aquela sensação fosse durar para sempre.

Muitos de nós não tem atenção ao corpo e só sentimos parte do corpo quando estamos doentes. É muito importante percebemos que não podemos ver o corpo como uma máquina e não podemos esperar as sensações desagradáveis chegarem para começarmos a nos cuidar. O autocuidado é um trabalho preventivo e é um trabalho que começa antes da doença chegar para que possamos lidar melhor com ela, caso chegue.

Se toda vez que ficamos doentes ou alguém próximo ficar doente, entraremos em pânico com medo daquela pessoa morrer, e de tanto sofrimento que ela vai passar, estaremos em estresse constante. Ao falar sobre a aceitação da morte, não significa que temos que nos conformar e não nos importar, pelo contrário, temos que começar a tentar imaginar como seria aceitar a morte. Nunca aceitaremos 100% porque o medo é algo instintivo. Lá no fundo sempre vai haver um resquício de medo. O que precisamos fazer é aos poucos irmos refletindo e aceitando que esse dia irá chegar, tanto para mim, quanto para aqueles que estão à minha volta e só me resta aproveitar o tempo que ainda tenho com eles.

Estamos sempre sendo ensinados de que a doença é algo extremamente ruim e que devemos evita-la pois não estaríamos aqui enquanto espécie. Mas isso também nos leva a um lugar de pavor da morte e pavor da doença. A doença e a morte são fatores inerentes à existência, não só humana. Qualquer coisa que respira no mundo está fadada ao nascimento e a morte. Esse ciclo é natural e, por meio da aceitação, devemos trabalhar nossa relação com a doença e com a morte, senão seremos sempre escravos do medo do não existir, acabando consequentemente por ter uma vida automática, superficial, baseada em evitar o medo. Dessa forma, quando ele chega, sofremos.

Marcus Santos, Instrutor do Programa de Redução do Estresse MBSR