O caminho do meio
Este tema é muito publicado em livros e artigos de revista e na maioria das vezes é abordado de maneira superficial. Podemos ver de forma mais objetiva esse conceito tão profundo de uma maneira simples.
É necessário reconhecermos que qualquer coisa que se consiga nominar agora possui o seu oposto: a felicidade e a tristeza, o dia e a noite, o prazer e a dor, tudo possui o seu lado oposto. Sendo assim, a vida é dual. Nós vivemos num mundo de dualidades. Por isso que é tão difícil falar sobre o caminho do meio e principalmente praticá-lo, pois desde muito pequenos nós nos encontramos perdidos entre o caminho do apego e da aversão. Seja o apego ao prazer de ser amamentado pelo seio da mãe ou de sermos saciados quando estamos com frio ou com fome. Estamos sempre evitando aquilo que supostamente nos trás descontentamento e buscando prazer a qualquer custo.
Toda origem do sofrimento reside na vida de dualidades. Sendo assim, nós precisamos treinar a mente para observar. O mundo não vai mudar, a dualidade não vai acabar, muito menos o apego e a aversão. Mas é possível desenvolvermos a habilidade de nos observarmos antes de reagir, e no final, é disso que se trata o caminho do meio, simplesmente não se engajar nos pensamentos, nas vontades e nas emoções e sensações do corpo.
Para praticar o caminho do meio, basta observar antes de agir para fazer escolhas mais equilibradas. Nós nunca vamos praticar cem por cento do caminho do meio, o desafio é justamente manter essa intenção de não se deixar levar, de não se engajar nas dualidades da vida.
O ponto mais importante não é deixar de ser quem se é, mudar completamente os hábitos ou a rotina. O primeiro passo é justamente se esforçar a cada dia e a cada momento para ter mais equilíbrio. A meditação não é um caminho de negação nem de afirmação. Ela nos mostra os paradoxos do universo, dentro e além dos opostos. Ela nos ensina a estar no mundo, mas não ser o mundo, essa é a compreensão do caminho do meio. No momento em que nós nos sentamos para meditar nós já estamos praticando o caminho do meio.
É justamente na prática formal de meditação que nós vamos contemplar a impermanência e compreender que tudo passa. O que é bom passa e o que é ruim também passa. Se buscarmos a felicidade por meio da indulgência, não seremos livres, e se lutarmos contra nós mesmos e o mundo também não seremos livres. É o caminho do meio que nos traz liberdade.
A prática se dá no momento que decidimos deixar de ser reféns da necessidade de prazer e do medo do desprazer. Nós não podemos continuar vivendo uma vida em busca do contentamento no lugar errado. É preciso nos aprofundarmos no caminho do meio, parando de nos engajar nesses jogos de opostos. Sem dúvida, no começo vai ser difícil rever os seus apegos e as suas aversões, mas isso vai ser mais sedimentado com o tempo.
Não é preciso ter pressa para estar no caminho, o importante é praticar a auto-observação.
Nós podemos ter o nosso trabalho e os nossos objetivos e experienciar a vida sentindo prazer e evitando sofrer, mas de uma maneira mais aberta. Sendo assim, quando eu estiver vivenciando algo muito bom, eu posso dizer para mim mesmo: “Isso também vai passar”. E quando estiver vivenciando algo muito ruim, eu posso dizer a mim mesmo: “Isso também vai passar”. Aprendendo a abraçar a tensão e o relaxamento e observando as mudanças da vida sem lutar contra o fluxo natural das coisas.
Claro que sempre podemos imaginar condições mais perfeitas, como as coisas deveriam ser idealmente e como todos os outros deveriam se comportar, mas não é essa a nossa tarefa. Nossa tarefa é aprender como o mundo realmente é, para o despertar do coração, as condições estão sempre boas o suficiente. Sendo assim, não precisamos esperar o tempo certo para começar a ser mais equilibrado nem temer a mudança da sua própria forma de ser. Talvez agora seja um bom momento para rever essa necessidade excessiva de prazer e de conforto e rever também a aversão extrema ao desconforto. Assim podemos ser mais tranquilos, acolhendo o bom quando ele vem, e acolhendo também o desagradável, sem julgar, sem comparar, compreendendo a impermanência.